Perfil de paciente com enxaqueca é cada vez mais jovem
Problema que atinge 30 milhões de pessoas no Brasil
Mais de um bilhão de pessoas, cerca de 15% da população mundial, convivem com uma doença que é facilmente confundida com seu sintoma: a dor de cabeça. Transportando para o Brasil, esse número chega a 30 milhões. Com quase trinta anos de experiência no atendimento clínico, Alexandre Kaup percebe uma mudança no perfil dos pacientes com enxaqueca crônica. “Não se via pacientes com enxaqueca crônica com 12, 14 anos de idade. Hoje, vemos bastante. Houve um certo agravamento da doença ao longo do tempo, consequência de uma série de fatores”, relata o neurologista.
“A dor de cabeça é normalizada socialmente. Na verdade, a crise de enxaqueca começa 24 horas antes da dor. As pessoas têm o sono alterado, bocejam muito, sentem muita sede, muita fome, tem gatilhos para comer alimentos específicos, geralmente mais gordurosos. Isso já faz parte da crise, só não veio a dor de cabeça ainda, que é uma etapa da enxaqueca”, avalia a neurologista e coordenadora científica do Instituto do Cérebro do Hospital Israelita Albert Einstein, Lívia Dutra.
Segundo Kaup, um dos componentes de cronificação da doença é o uso excessivo de analgésicos (mais do que 10 dias no mês). Apesar de cada vez mais jovens buscarem ajuda, a identificação da doença, segue sendo, de uma maneira geral, uma questão a ser resolvida.
Diagnóstico
“O grande gargalo na jornada do paciente está em ele ser diagnosticado adequadamente e receber a recomendação do tratamento adequado. Os pacientes demoram muito tempo para ter o diagnóstico. Por quê? Voltamos ao fato de que a doença é confundida com o sintoma. A pessoa se trata com analgésico, só que isso só piora”, reitera.
Kaup sugere que a tecnologia seja uma aliada para suprir essa dificuldade: “A Inteligência Artificial poderia encurtar a jornada do paciente, que é muito longa. Por exemplo, o indivíduo poderia ter acesso a uma ferramenta que ajudasse ele a entender a dor, em que ele pudesse ser educado e orientado por um profissional”.
Uma rápida pesquisa em lojas de aplicativo para smartphones mostra que já há no mercado alguns softwares direcionados para quem tem enxaqueca. A maioria tem a função de diário, onde o usuário anota os dias em que teve dor, a intensidade, duração, se teve outros sintomas, se observou um fator desencadeante, com o que se medicou etc. Alguns apps oferecem ainda a opção de criar relatórios que podem ser enviados ao médico em formato PDF.
R$ 67,6 bilhões por ano
Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), a enxaqueca é a segunda maior causa de incapacidade laboral e de limitações na vida social, ficando atrás apenas dos casos de Acidente Vascular Cerebral (AVC). No país, ela causa um prejuízo calculado em R$ 67,6 bilhões por ano – referente à perda de dias de trabalho (absenteísmo) e queda de produtividade (presenteísmo) –, segundo um estudo brasileiro publicado na Cephalalgia (revista da Internacional Headache Society).
Além disso, com base na literatura médica, a Sociedade Brasileira de Cefaleia adverte que pacientes com a patologia representam 4,5% dos atendimentos em unidades de emergência, atingindo ainda o quarto lugar entre os motivos mais frequentes de consulta nas unidades de urgência. Trata-se de um problema grave de saúde pública. Apesar disso, muitas pessoas ignoram a necessidade de cuidado quando sofrem com dores de cabeça constantes.
Diferenças
Diferentemente da cefaleia, a enxaqueca envolve múltiplas manifestações clínicas. A neurologista explica que a enxaqueca é uma doença caracterizada pela alteração da percepção dos estímulos sensoriais: “É um problema do funcionamento do neurônio, não é um problema anatômico do neurônio. O paciente que tem enxaqueca tem um funcionamento excessivo do neurônio em algumas regiões do cérebro”.
Kaup, reforça que a enxaqueca é uma doença genética determinada pela “hiperexcitabilidade”. Porém, a patologia é facilmente confundida pelo seu principal sintoma: “Como ela é uma doença muito conhecida por um sintoma, que é a dor de cabeça, ela acaba sendo confundida. Isso traz uma dificuldade, porque você acaba tratando uma doença como se fosse um sintoma. A dor de cabeça do paciente que tem enxaqueca começa fraca e se torna forte, geralmente dura entre quatro horas e três dias. É uma dor que muda de lugar, que piora com movimentos rotineiros ou exercício físico, vai ser acompanhada de uma maior sensibilidade à luz e sons e tem a presença de náusea e vômito.
Com informações da Agência Einsten